A nova Lei da Guarda Compartilhada - como funciona?

A presidente Dilma Roussef sancionou a Lei 13.058 de 2014, que altera alguns artigos do Código Civil em relação à questão da Guarda Compartilhada.

As questões relativas à guarda são em sua enorme maioria uma consequência direta de divórcio ou separação do casal e geralmente representam seu ponto nevrálgico. É aí que a maioria dos problemas de natureza não patrimonial acontecem.

Direito da Família: O que é guarda compartilhada e guarda unilateral

Nosso ordenamento jurídico, com a promulgação da Lei 11.698 de 2008, comporta duas modalidades legais de guarda: compartilhada e unilateral. A natureza de cada uma dessas soluções é auto-explanatória. O que é importante aqui é ressaltar o que cada uma delas significa do ponto de vista prático, pois há o risco de entender-se que a guarda unilateral, por exemplo, não implica em direitos ou deveres da parte que não foi contemplada com a guarda. Não é bem assim.


O cônjuge que não tem a guarda do menor tem o direito e o dever supervisionar os interesses dos filhos. Por exemplo, pode e deve inteirar-se da vida escolar da criança, conversando com seus professores, tendo acesso aos boletins e participando regularmente das reuniões de pais e mestres. Isso é um direito e um dever emanado do próprio teor da legislação e reforçado pelo teor da nova Lei. Um exemplo: qualquer Instituição Pública ou Particular que deixar de prestar informações a qualquer dos genitores, incorrerá em multa de R$ 200,00 a R$ 500,00 por dia – a qual deve ser buscada pela via judicial.

O que muda na guarda compartilhada com a nova Lei

A maior inovação da lei diz respeito ao seguinte: em caso de não haver acordo entre mãe e pai quanto à guarda, o Juiz deverá aplicará a guarda compartilhada. Mas há duas exceçṍes à regra: a) quando um dos genitores não estiver apto a exercer o poder familiar, e b) quando um dos pais declarar que não deseja a guarda da criança. “Estar apto” é algo que não é tão simples quanto parece. É uma linha bastante tênue, e é justamente nesse ponto que a maioria das batalhas judiciais serão travadas. A questão engloba um leque enorme de possibilidades: desde a completa impossibilidade por culpa do próprio genitor (problemas com abuso de álcool e drogas estão no topo da lista) até questões circunstanciais (como, por exemplo, a distância entre a moradia da mãe em relação à do pai)

Abusos físicos ou psicológicos por um dos pais, exposição a riscos de ordem física ou moral e situações de abandono são apenas alguns dos problemas que demandam uma solução mais complexa. Para isso, a nova Lei prevê mecanismos de segurança – os quais, diga-se, não são nada novos -, prevendo restrições ao compartilhamento da guarda pela chamada inaptidão de um dos pais (como já mencionado acima) e a utilização de orientação técnico-profissional adequada a conferir a exata dimensão dos fatos (como a utilização, a critério do Juiz, de psicólogos e assistentes sociais).  Dependendo do grau de seriedade da matéria e do risco do menor – e o abuso sexual é um exemplo clássico – há possibilidade de lançar-se mão de uma solução mais drástica: a perda do poder familiar. Mas isso é outra história.

Aplicabilidade da nova lei de Guarda Compartilhada

O fato é que a questão é muito nova e o Poder Judiciário ainda vai começar a enfrentar o problema, o que significa que não haverá uniformidade nos julgamentos por algum tempo. Questões de Direito de Família que envolvam guarda e direito de visitas são problemas complexos e muitas vezes geram disputas amargas. Enquanto alguns casais que passam pelo processo de divórcio chegam amigavelmente à um denominador comum para exercer a chamada guarda compartilhada de seus filhos – ou seja, o exercício conjunto dos direitos e deveres inerentes ao genitor –  outros, por uma série de razões, podem ter esse caminho obstruído.

E é justamente essa a maior crítica ao teor dessa nova Lei: a aplicação obrigatória da guarda compartilhada em ambientes de conflito pode ser devastadora para a criança. As disputas podem ser transformadas em um verdadeiro cabo de guerra, e quem sofrerá com isso são os filhos. Impor um regime que pressupõe o mínimo de harmonia em um ambiente de hostilidades pode ser algo muito perigoso aos interesses do menor.

Como esse elemento – o interesse da criança – é um bem juridicamente mais valioso que o interesse dos pais, poderemos ter decisões judiciais que contrariem a regra da obrigatoriedade do regime de guarda compartilhada, mesmo não havendo qualquer inaptidão dos genitores. Mas é preciso esperar para ver.

Guarda Compartilhada e Mediação Familiar

Para questões não tão sérias, o problema pode e deve ser resolvido com um acordo de vontades. O desgaste em situações de conflito, tanto para as crianças como para seus pais e outros membros da família, é evidente e a solução amigável, quando possível, é óbviamente mais vantajosa para todos.

A guarda compartilhada é um fato, e isso muitas vezes não é do agrado de todos os envolvidos. Mas se é algo que não se pode evitar, o melhor é fazê-lo de maneira pacífica, poupando-se o desgaste de uma batalha interminável.

Para tanto a mediação familiar revela-se como uma grande ferramenta de resolução de disputas e representa uma alternativa muito vantajosa ao processo judicial. Clique aqui para obter mais informações sobre o que a mediação familiar pode oferecer para você.

Preservando os interesses da criança

Se a guarda compartilhada for considerada pelo Juiz como desvantajosa aos interesses da criança, a guarda unilateral será o caminho a seguir e poderá ser exercida tanto pela mãe quanto pelo pai do menor. A decisão sobre quem irá exerce-la levará em conta pincipalmente os benefícios que isso trará à criança, valendo-se o Magistrado também da opinião técnica de auxiliares da justiça, como já verificado acima.

De qualquer forma, é importante salientar que o interesse dos pais não irá sobrepor-se ao interesse dos filhos, e irá influir no caso apenas se coincidirem com o do menor ou concorrerem para o bem estar destes. Por isso, antes de entrar em uma batalha judicial, pense bem quais são as razões da disputa e tente se colocar no lugar da criança. Esse exercício muitas vezes terá o efeito de melhorar a compreensão geral do quadro e evitar maiores desgastes para todos os envolvidos.

Mario SolimeneAuthor posts

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Advogado formado pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (FADUSP - Largo de São Francisco), turma de 1994, com especialização em Direito Privado e Processo Civil. Inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil, São Paulo, sob o número 136.987. Pós graduado (Pg.Dip.) e Mestre (MMus) pela University of Manchester e Royal Northern College of Music, Reino Unido (2003-2006). Curso de Extensão em Direitos Humanos Internacionais sob supervisão de Laurence Helfer, J.D, Coursera, School of Law, Duke University, EUA (2015). Inscrito como colaborador da entidade Lawyers Without Borders (Advogados Sem Fronteiras) e membro da International Society of Family Law (Sociedade Internacional de Direito de Família). Tomou parte em projetos internacionais pela defesa da cidadania e Direitos Humanos na Inglaterra, Alemanha, Israel e Territórios da Palestina. Fluente em Inglês, Espanhol, Italiano e Alemão.

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